mamãe posso ir?
- bebê
- 27 de mar. de 2021
- 1 min de leitura

- por cristine zancani
- Mamãe, posso ir?
- Pode
- Quantos passos?
- Dois de borboleta
E lá ia eu, avançando em voo.
Na verdade, não existiam passos de borboleta. Essa é uma falsa lembrança que meu desejo atual de leveza inventa. Os passos da brincadeira eram sempre terrenos: grandes passos de elefante, passos mínimos de formiga, passos em pulo de coelho.
Todo caminhar se dava a partir de uma mãe que consentia, mas que decidia o quão longo ou curto seria o trajeto.
Hoje, acordei pensando:
- Mamãe, posso ir?
Não veio resposta.
Mesmo assim, tentei saber:
- Quantos passos?
Não veio a orientação sobre o caminhar.
Então, caminhei por conta própria: os infinitos passos de mulher na pandemia.
As perguntas da brincadeira ficaram soltas pela casa. Acho que perguntas sem resposta habitam a casa como fantasmas.
De noite, as escadas vão ranger:
- Mamãe, posso ir?
E o piso vai estalar:
- Quantos passos?
Ate que a voz da mãe responda em mim:
Dois de borboleta
E a leveza se (re)faça nesse voo.
cristine zancani - março de 2021
foto de gil baumgarten
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